Essa é uma pergunta que continua surgindo, especialmente devido à popularidade do livro Planta Sapiens, que argumenta a favor da senciência das plantas. Neste texto, examinamos as alegações, a ciência por trás delas e as implicações para nossas decisões éticas, caso as plantas realmente sintam dor.
As plantas são sencientes?
Existem centenas de milhares de diferentes plantas no planeta, cada uma com propriedades distintas, em um organismo complexo e intrigante. Algumas têm flores que se viram para o sol. Outras capturam e comem insetos. Algumas produzem substâncias químicas para afastar predadores.
No livro Planta Sapiens, o filósofo Paco Calvo compartilha suas pesquisas sobre o comportamento das plantas e argumenta que elas fazem mais do que apenas reagir por reflexo ao mundo ao seu redor. Ele acredita que as plantas “planejam para alcançar objetivos” e “têm um engajamento proativo com o ambiente”.
A ciência avançou muito desde a ideia de que as plantas são completamente passivas no mundo. Agora entendemos que elas se comunicam, compartilham recursos e usam sinais elétricos para coordenar suas respostas ao ambiente. Estamos aprendendo cada vez mais sobre elas. Uma certeza que temos é que as plantas não têm cérebro.
Calvo argumenta que, embora as plantas não tenham cérebro, suas vidas internas surpreendentes indicam senciência e, com ela, vem a capacidade de experimentar dor e sofrimento. É aí que entra a questão ética: se as plantas podem sentir dor, qual é a nossa responsabilidade com elas?
As plantas têm consciência?
Isso depende muito de como você define consciência. Se você pesquisar on-line pela definição, vai ver que cada publicação científica descreve a consciência de maneira diferente. Muitas definições são baseadas no indivíduo estar ciente de si e do mundo ao seu redor. E, se adotarmos essa definição, poderíamos dizer que as plantas têm consciência.
Mas a ciência nunca é tão simples, e há muito mais discussão, debate e detalhes em torno dessa definição, especialmente quando falamos sobre a experiência da consciência. Ou seja, como essa consciência é percebida pelo indivíduo? Uma definição sugere que a consciência envolve ter uma imagem mental do mundo e um elemento emocional. Resumidamente, essa definição implica que os indivíduos conscientes podem se sentir bem ou mal em relação às suas experiências, o que parece excluir a consciência nas plantas.
Em termos científicos tradicionais, a consciência depende da presença de um cérebro e de um sistema nervoso. No entanto, aqueles que defendem a consciência das plantas afirmam que as elas ainda têm uma experiência rudimentar da vida, uma forma de consciência não neural. Ainda assim, é considerada uma forma de consciência.
Dado que cientistas e filósofos acreditavam que os animais não tinham consciência, cérebro, inteligência e não sentiam dor, é importante mantermos a mente aberta sobre a consciência. Tanta dor foi infligida aos animais porque os humanos negavam de maneira arrogante as experiências de outros seres. Agora, a ciência reconhece o que muitos de nós sempre soubemos: que os animais são sencientes, têm consciência e podem sentir dor. Então, talvez, a ciência também esteja errada sobre as plantas.
Plantas e consciência: o que diz a ciência?
Até o momento, o consenso científico é de que as plantas não são conscientes. O que dizem:
- A alegação de que algumas plantas podem se orientar proativamente pode ser explicada por mecanismos simples de resposta comportamental, sem que seja necessária a consciência.
- Apesar de as plantas e os animais usarem sinais elétricos para regular as funções corporais, esses sinais são transportados e funcionam de maneira bastante diferente. Portanto, não podemos presumir que o que vale para os animais se aplique necessariamente às plantas.
- As plantas não têm cérebro, nem sistema nervoso central, e não há evidência suficiente de nenhum tipo de “cérebro” nas raízes, como algumas pessoas afirmam.
- Não há aprendizado associativo nas plantas, ou seja, elas não fazem associações entre eventos que acontecem juntos.
- Apesar de as plantas se comunicarem entre si, isso não indica um senso de si e do outro, e não implica consciência. Essa capacidade de comunicação pode ser explicada por estímulos.
E sem consciência, não há experiência de dor.
As plantas gritam?
Quase todos os cientistas concordam que as plantas não podem sentir dor, mas novas evidências que estão surgindo desafiam nossas percepções sobre o que é ser uma planta. Pesquisadores da Universidade de Tel Aviv descobriram recentemente que plantas de tomate e tabaco se comunicam via sons semelhantes a cliques. “Quando essas plantas estão saudáveis”, disse a professora Lilach Hadany, “elas produzem menos de um som por hora, mas quando estressadas emitem muito mais, às vezes entre 30 a 50 sons por hora.”
Os sons emitidos são muito agudos para os humanos ouvirem, mas insetos e pequenos mamíferos podem detectar essas frequências, sugerindo que essas plantas possam estar enviando sinais que mudam o comportamento dos animais ao seu redor.
Mas as plantas gritam? Novamente, isso depende do que entendemos por “gritar”. Se entendermos isso como “emitir um som devido a um fator estressante”, então sim. Se incluir um elemento emocional ou sensorial, como medo ou dor, então provavelmente não.
É cruel comer plantas?
Conforme aprendemos sobre a complexidade da vida das plantas, podemos refletir sobre nosso próprio comportamento e se é ético comê-las. Ainda assim, as evidências de que as plantas sentem dor são pouco convincentes, mas um dia talvez descubramos que elas realmente experimentam algo que podemos chamar de dor. Até lá, o que devemos fazer?
Como seres éticos, temos uma escolha. Podemos comer animais que são sencientes, definitivamente sentem dor e claramente mostram sua individualidade, personalidades, preferências e desejo de viver. Ou podemos comer plantas que são complexas e distintas, mas para as quais atualmente não há evidência clara de uma capacidade de sofrer.
Para aqueles que desejam minimizar o risco de causar sofrimento, a escolha é clara: devemos comer plantas. E não apenas devido à quantidade de sofrimento envolvido, mas também pelo número de plantas.
Pessoas veganas são cruéis com as plantas?
Um fato interessante, mas contraintuitivo, é que as pessoas que consomem carne são responsáveis pela colheita e pela morte de muito mais plantas do que as veganas. Isso acontece porque uma grande quantidade de plantas é necessária para alimentar um animal explorado em fazenda, e uma quantidade muito menor de calorias é devolvida na forma de carne, leite ou ovos do que aquela utilizada para alimentar o animal durante toda a sua vida.
É por isso que comer carne demanda tanta terra (para cultivar pastagem ou plantação de vegetais para alimentar os animais). Também é por isso que a carne impulsiona o desmatamento e a destruição em massa das florestas.
Quando consideramos tanto as plantas consumidas diretamente por uma pessoa que come carne quanto aquelas utilizadas para alimentar os animais que ela consome, o total é muito maior do que a quantidade de vegetais consumidos por uma pessoa vegana.
Comer carne é a principal causa de destruição de plantas. Portanto, qualquer pessoa preocupada com a capacidade das plantas de sofrer pode reduzir drasticamente sua contribuição cortando a carne e comendo apenas vegetais.
Conclusão
Estamos aprendendo cada vez mais sobre a vida e as experiências das plantas, e não há dúvida de que elas são fascinantes, complexas e ainda pouco compreendidas. É possível que um dia a gente descubra que elas têm alguma forma de consciência e que experimentam emoções e sensações, incluindo a dor. Mas essa não é a nossa realidade hoje.
No entanto, as plantas são importantes por si só. Não apoiamos a destruição desenfreada de florestas e outros habitats para facilitar o comércio global de carne. Também não apoiamos o enorme desperdício de vida vegetal que é inerente às indústrias de carne, ovos e laticínios, nem o desperdício de alimentos.
Nosso foco está em proteger aqueles que definitivamente sentem dor, que gritam quando estão assustados ou machucados e cujas vidas realmente importam para eles: os animais. Ao protegê-los por meio de uma escolha alimentar vegana, sabemos que também estamos causando muito menos impacto nas plantas, tornando o veganismo a opção mais compassiva para todos.